APREMO: “Temos Licenciados que Não Sabem Ler”

Nampula – A Associação dos Professores Reformados de Moçambique (APREMO), sediada em Nampula, manifesta crescente inquietação diante do estado atual da educação no país, considerando que a degradação do ensino compromete seriamente o desenvolvimento da nação.

Os membros da associação relembram com orgulho o período em que estavam no ativo, destacando que, naquela época, mesmo os alunos das primeiras classes já sabiam ler e realizar operações básicas de matemática. Hoje, afirmam, esse cenário mudou drasticamente.

Em conversa com o Jornal Ikweli, os docentes reformados apontaram múltiplas causas para a queda na qualidade do ensino, responsabilizando, em parte, o próprio governo moçambicano por aceitar diretrizes impostas por parceiros externos no setor da educação.

Um dos principais pontos criticados é o sistema de passagens automáticas, que permite a progressão dos alunos independentemente do seu desempenho. Segundo os reformados, essa medida, introduzida por influência de financiadores estrangeiros, contribuiu para a desvalorização do esforço nos estudos e para o declínio do sistema educacional.

“Olhamos com atenção para o sistema de ensino atual e comparamos com o passado. Antes, o ensino era focado, havia dedicação, e o professor conseguia transmitir o conhecimento com eficácia. Hoje, vemos crianças que passam de classe sem dominar o básico”, disse Augusto Tauancha, membro da APREMO.

Tauancha explica que a criação da associação visa também oferecer um contributo ativo para a melhoria da educação, sobretudo através da formação de novos professores. A APREMO pretende tornar-se um centro de capacitação pedagógica, aproveitando a experiência dos educadores aposentados.

“Queremos olhar para trás e usar as lições do passado para corrigir os erros do presente e preparar um futuro melhor. A educação precisa ser tratada com seriedade, e os professores aposentados têm um papel fundamental nesse processo”, reforçou.

Segundo ele, é essencial que o Ministério da Educação trate a educação como um setor estratégico e soberano, evitando se submeter a reformas sucessivas que, em vez de consolidar o sistema, acabam por enfraquecê-lo.

“O país já passou por mais de 30 reformas educacionais desde a independência. Isso é exagerado e impede qualquer estabilidade. Os parceiros podem ajudar, sim, mas não devem impor métodos nem ditar como se ensina”, argumentou Tauancha.

Ele também criticou a fragilidade das instituições de supervisão da educação no país. “O INDE [Instituto Nacional de Desenvolvimento da Educação] perdeu força. Hoje temos livros com erros circulando nas escolas. Isso é inaceitável”, lamentou.

Julieta Mepetia, outra integrante da APREMO, partilha das mesmas preocupações. “A forma como o ensino é conduzido hoje não se compara com o passado. O aluno da 1ª classe já lia; agora, temos alunos até na 6ª que não sabem ler. Isso é preocupante”, disse.

A docente reformada defende que os novos professores, após formados, passem por uma etapa de orientação com os mais experientes, para absorver práticas pedagógicas que foram eficazes no passado.

Guilherme José Castro, também membro da associação, relata casos de pessoas com grau de licenciatura que demonstram dificuldades até mesmo na leitura ou conjugação verbal. “Isso é resultado de uma aprendizagem baseada na repetição e não na compreensão. Os alunos hoje apenas decoram os textos dos livros. Isso não é aprender a ler”, destacou.

A APREMO defende que a educação deve voltar a priorizar a alfabetização real, o domínio do alfabeto e da leitura antes de introduzir conteúdos mais complexos. Os professores reformados acreditam que, com o envolvimento de todos, ainda é possível reverter o atual cenário e resgatar a dignidade do sistema educacional moçambicano.

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