A política monetária moçambicana continua distante de cumprir um papel decisivo no processo de desenvolvimento económico do país. Em vez de impulsionar a transformação produtiva, tem agido como travão, segundo aponta um estudo recente do economista Carlos Muianga, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), divulgado no boletim IDeIAS.
Desalinhamento entre instrumentos e realidade económica
Muianga observa que os mecanismos usados pelo Banco de Moçambique, como a taxa MIMO e as reservas obrigatórias, muitas vezes são desenhados e aplicados sem considerar as especificidades estruturais da economia nacional. Tais instrumentos, longe de facilitar o crédito e o investimento, acabam por elevar os custos de financiamento e restringir o crescimento dos setores produtivos.
“O banco central até pode reduzir as taxas de juro, mas ao manter as reservas obrigatórias em níveis elevados, anula qualquer impacto positivo que se esperava com a flexibilização da política”, aponta o investigador.
Reservas cambiais: abundância que não se sente
Num cenário já fragilizado por choques externos e dependência da exportação de matérias-primas, Muianga denuncia uma contradição entre o discurso otimista das autoridades e a escassez de divisas no mercado. Embora se afirme haver reservas internacionais suficientes, o acesso a essas divisas permanece limitado, criando um défice artificial.
“Diz-se que temos reservas, mas não podemos usá-las. Isso revela um desajuste entre a narrativa oficial e a prática económica que impacta diretamente a produção e o investimento”, critica.
Foco excessivo na inflação deixa outros setores para trás
O estudo critica ainda a postura do Banco de Moçambique de centrar a sua política exclusivamente no controlo da inflação, em detrimento de metas como o crescimento económico, a geração de empregos e a diversificação produtiva.
Preservar o valor do metical, segundo Muianga, não pode ser um objetivo isolado, se isso significar negligenciar as bases para um desenvolvimento mais inclusivo.
Sistema bancário elitista e excludente
Outro ponto central da análise recai sobre o impacto desigual da política monetária. Segundo Muianga, o sistema financeiro do país está fortemente concentrado, operando em benefício das elites urbanas e do capital estrangeiro, enquanto marginaliza pequenas e médias empresas nacionais, que enfrentam juros elevados e exigências de garantias inacessíveis.
“As medidas actuais aprofundam as desigualdades no acesso ao crédito, distanciando ainda mais quem precisa de recursos para produzir daqueles que já os detêm”, afirma.
Austeridade como entrave ao progresso
Muianga também critica a rigidez fiscal e monetária, apontando que a prioridade dada à contenção orçamental tem limitado a capacidade do Estado de fomentar a produção interna e expandir a base económica nacional.
Gráficos do boletim ilustram as incoerências dessa política, mostrando que, desde 2024, embora as taxas de referência tenham sido reduzidas, a manutenção de reservas obrigatórias elevadas e os spreads bancários excessivos continuam a travar o dinamismo económico.
Transformação exige mais que estabilidade nominal
Concluindo, o economista defende que o combate à inflação deve caminhar lado a lado com uma agenda mais robusta de industrialização, substituição de importações e criação de emprego. Para o IESE, é necessário reconfigurar a política monetária como uma ferramenta de transformação estrutural e não apenas de regulação de indicadores financeiros.
Enquanto essas contradições persistirem, adverte Muianga, Moçambique continuará a seguir um rumo desalinhado com os princípios de justiça económica e desenvolvimento inclusivo.