Em Moçambique, onde cerca de 80% da população está inserida no sector informal — maioritariamente jovens —, o director executivo da Associação dos Trabalhadores Informais de Moçambique (ASTIMO), Armindo Chembane, fez um apelo contundente ao Governo: é preciso reconhecer o valor escondido nos mercados informais. “Somos como o petróleo de Cabo Delgado: quem nos interpretar, pode descobrir grandes riquezas”, afirmou em entrevista ao Dossiers & Factos.
Durante a conversa, Chembane lamentou o distanciamento do Executivo em relação ao sector informal, apontando críticas diretas ao Ministério da Juventude e Desportos (MJD), que, segundo ele, ignorou um pedido de audiência feito há meses. Em contrapartida, reconhece que o Ministério do Trabalho, Género e Acção Social tem mostrado alguma abertura para o diálogo.
Para Chembane, a falta de resposta pode estar ligada ao preconceito contra o carácter informal da ASTIMO. “Talvez não fomos atendidos por sermos informais. Mas que mensagem isso transmite?”, questiona. Ele defende que, se o MJD tivesse escutado a associação, teria compreendido que o sector, dominado por jovens, está repleto de potencial oculto.
“O que se vê como vulnerabilidade nos mercados, especialmente entre os jovens vendedores, na verdade esconde talento no desporto, na música e na cultura”, sublinhou. Chembane defende que os mercados informais escondem “milhares de Mr. Bows” — artistas e talentos que carecem apenas de uma oportunidade para brilhar.
Ele propõe iniciativas concretas, como torneios desportivos nos mercados, que poderiam revelar novos talentos, tal como surgiu Dominguez no futebol moçambicano. “Se forem promovidas actividades desportivas nesses espaços, se forem distribuídas bolas, vai-se perceber que por trás daqueles pequenos negócios de 10 meticais, existem milhões em potencial”, afirmou.
Para o líder da ASTIMO, reconhecer e valorizar o sector informal vai muito além da construção de mercados ou da remoção de vendedores das ruas. Trata-se de interpretar e valorizar as capacidades que ali existem. “Interpretar é identificar quem sabe fazer algo e dar-lhe as condições para se destacar”, defendeu.
Chembane também manifestou o desejo da ASTIMO em dialogar com o Ministério da Planificação e Desenvolvimento, afirmando que políticas públicas têm sido elaboradas sem o envolvimento de quem vive a realidade informal. “Pensam sobre nós sem nos conhecerem. Lembram-se do sector informal apenas em época de campanha”, criticou.
Para ele, o crescimento do sector informal é reflexo direto da ausência de empregos formais e do fracasso das políticas públicas nesse domínio. E termina com um apelo claro: “Se o Governo quiser realmente construir um futuro sustentável, precisa de nos incluir nas decisões. Só assim deixaremos de ser invisíveis.”
