Sistema de Declaração de Bens falha no combate à corrupção, admite PGR

Apesar da entrada em vigor da nova Lei da Probidade Pública e da introdução do sistema electrónico de Declaração de Bens (e-DB), a Procuradoria-Geral da República (PGR) ainda não dispõe de mecanismos eficazes para aferir a legalidade e a veracidade das informações prestadas pelos servidores públicos. Essa revelação levanta sérias dúvidas quanto à capacidade do sistema de combater de forma concreta o enriquecimento ilícito e promover a transparência na administração pública.

Segundo declarações feitas no dia 5 de Maio pelo porta-voz da PGR, Ribeiro Cuna, até ao momento não há registo de nenhum caso de enriquecimento ilícito identificado e sancionado com base nas declarações submetidas através da nova plataforma. Cuna enfatizou que o foco da instituição, neste momento, está voltado para a sensibilização e não para a punição, mesmo com cerca de 18% dos funcionários cadastrados ainda em falta com a sua obrigação declarativa.

Num país em que a corrupção é vista como um problema estrutural e onde a função pública frequentemente ocupa o centro das denúncias, a falta de ferramentas para validar o conteúdo das declarações compromete a eficácia da Lei da Probidade. A expectativa era de que a nova legislação e a sua plataforma digital servissem como meios robustos para rastrear variações patrimoniais injustificadas e responsabilizar os autores.

Contudo, a realidade parece distante desse ideal. O sistema e-DB, que exige apenas uma declaração inicial — a ser actualizada somente em caso de alterações significativas no património — não requer documentos comprovativos, nem mesmo para bens no estrangeiro. Isso significa que o processo se baseia exclusivamente na boa-fé do declarante, algo que é questionável num ambiente com fortes indícios de corrupção institucionalizada.

“A plataforma não exige que a pessoa submeta qualquer documento no acto da declaração. Parte-se do princípio de que cada funcionário irá declarar fielmente aquilo que possui”, afirmou Ribeiro Cuna, acrescentando que há profissionais responsáveis pela análise das declarações. No entanto, não foi especificado como essas análises são feitas, quais dados são cruzados, nem como se procederia caso fossem encontradas incongruências.

A ausência de clareza quanto aos mecanismos de fiscalização fragiliza ainda mais a função preventiva e dissuasora do sistema. Apesar de haver previsão legal para penalizar declarações fraudulentas, a própria PGR admite que não existem exemplos concretos de sanções aplicadas, nem informações públicas sobre casos investigados e resolvidos com base nas declarações electrónicas.

Quando pressionado por jornalistas sobre a existência de casos de enriquecimento ilícito detectados por meio deste sistema, Cuna respondeu de forma evasiva: “Não temos dados neste momento, aqui e agora”, remetendo para outras instâncias ou futuras possibilidades.

Sem a demonstração prática de eficácia e sem mecanismos claros de verificação, a promessa de transparência e responsabilização oferecida pela Lei da Probidade Pública permanece, por enquanto, apenas no papel.

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