Alguns dos maiores bancos moçambicanos, como o BCI e o Standard Bank, estão sob suspeita de adotarem estratégias para não cumprirem uma ordem judicial que determina a penhora de contas da multinacional TotalEnergies, com vista ao pagamento de uma dívida milionária à empresa moçambicana Passion For Brands, Lda. A dívida, resultante da falta de pagamento de fornecimentos realizados no âmbito de um contrato, ascende a mais de 1,3 mil milhões de meticais.
A situação está a ser vista como um desafio direto à autoridade judicial e uma tentativa de proteger interesses de grandes clientes, levantando também suspeitas de interferência política e pressões sobre o sistema judiciário.
Em processos distintos no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, a TotalEnergies foi condenada a liquidar a dívida contraída junto da Passion For Brands, que forneceu materiais promocionais para o projeto Tunawesa e equipamentos para iniciativas como o New Vision em Cabo Delgado, além de artigos para campanhas de imagem.
A documentação em posse da imprensa revela que a TotalEnergies solicitava os bens mediante requisição formal, mas negligenciou os pagamentos acordados, permitindo que a dívida ultrapassasse 800 milhões de meticais e chegasse ao valor actual devido à mora acumulada.
Mesmo após uma auditoria contratada para apurar o valor real da dívida — a cargo da Delloite — a TotalEnergies recusou partilhar os resultados, tendo feito um pagamento parcial de apenas 181 milhões de meticais, valor contestado pela fornecedora por não refletir o custo efetivo dos produtos entregues.
Uma nova auditoria independente, com base em documentos rubricados por funcionários da TotalEnergies, confirmou que até Outubro de 2023 foram fornecidos bens no valor de mais de 841 milhões de meticais. Com os pagamentos parciais já feitos, a dívida remanescente apurada chegou aos 643 milhões de meticais, aos quais se somam mais de 22 milhões de meticais em juros de mora.
A decisão judicial, proferida pela Juíza Maria da Luz, ordenou o pagamento da dívida e dos juros vencidos e vincendos, além de reconhecer a ligação da TotalEnergies a outras dívidas da Passion For Brands, como os 430 milhões de meticais em atraso com a MBZ – Mozambique Business Zone.
No entanto, os bancos envolvidos têm sido acusados de criar obstáculos à execução da sentença. O BCI foi notificado para penhorar os saldos nas contas da TotalEnergies até ao valor estipulado de 1,3 mil milhões de meticais, mas não respondeu formalmente. O Standard Bank, por sua vez, escuda-se numa garantia bancária alegadamente expirada, argumento contestado por não refletir a realidade dos termos judiciais.
Diante da resistência dos bancos em cumprir ordens de penhora, a Passion For Brands acionou o Banco de Moçambique, exigindo uma intervenção imediata para garantir o respeito às decisões judiciais. A empresa acusa os bancos de práticas recorrentes que visam inviabilizar execuções por via de acordos paralelos com grandes clientes, prejudicando fornecedores e comprometendo a justiça.
No seu pedido ao regulador, a Passion For Brands exige a responsabilização das instituições bancárias envolvidas, alertando para os danos causados à credibilidade do sistema financeiro e à soberania das decisões judiciais em Moçambique.
