A recente nomeação de Júlio Jane como novo Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) ocorre num momento de grande turbulência interna. O sucessor de Joaquim Rivas Mangrasse herda um exército fragilizado por sérias dificuldades logísticas, incluindo a escassez de alimentos nos quartéis, o que resultou na dispensa de militares para suas casas e na suspensão de formações militares.
Apesar do robusto orçamento anual destinado ao setor da Defesa – justificado pela luta contra o terrorismo, especialmente em Cabo Delgado – vários quartéis em todo o país enfrentam graves problemas de abastecimento. Em alguns casos, os soldados sobrevivem com apenas uma refeição por dia, muitas vezes consistindo apenas de pão com água e açúcar, o que tem contribuído para uma profunda crise de motivação entre os militares.
“Antes tínhamos, no mínimo, três refeições diárias. Agora, só comemos uma vez, e normalmente é feijão com chima. Somos obrigados a levar marmita para o quartel. É uma realidade que todos conhecem, inclusive o Ministério da Defesa”, relatou um militar baseado em Maputo que preferiu manter o anonimato por receio de represálias. Ele afirmou ainda que a situação se repete em outras províncias, com destaque para Cabo Delgado.
A escassez de comida também levou ao adiamento do início do curso de formação básica militar na Escola Prática do Exército de Munguine, no distrito da Manhiça. Previsto para começar em Abril, o treinamento foi suspenso indefinidamente. Tanto os instrutores quanto os recrutas foram instruídos a permanecer em casa, aguardando novas diretrizes.
Fontes dentro das FADM indicam que a origem da crise está nas dívidas acumuladas do Estado com fornecedores, que decidiram interromper o fornecimento até que os pagamentos sejam regularizados. Em alguns pontos do Teatro Operacional Norte (TON), unidades ameaçaram abandonar posições devido à falta de mantimentos, colocando em risco o esforço de combate ao terrorismo.
“O dinheiro está lá, mas não chega a quem está no terreno. O orçamento da Defesa é elevado, mas os militares continuam a passar fome. Parece que há desvios no meio do caminho”, denunciou outra fonte militar.
Com a exoneração de Mangrasse e a posse de Júlio Jane, promovido ao posto de General de Exército, a expectativa é de uma reestruturação interna capaz de restaurar a confiança e a moral das tropas. No entanto, o novo comandante terá pela frente o desafio de resolver problemas estruturais e restaurar a dignidade de quem arrisca a vida pela defesa da nação.